DIREITO PENAL BRASILEIRO

O positivismo criminal brasileiro se desenvolveu por um sistema de duplo corte que por um lado se destaca pela massiva exponencial manutenção e dilatação de um modelo intelectual e ideológico que desaparece com as técnicas dogmáticas, de modo, que cada vez mais se impulsiona a aplicação das normas em direção aos anseios populares que não são técnicos para pressionar o Estado com o objetivo que ele adote medidas que agrade a população, mas que não resolvem o problema no seu âmago da criminalidade.

Nas muitas vezes, as ações desenhadas por ele são apenas medidas paliativas, que maquiam o problema até que elas comecem a derreter e, do outro se desenvolve pela legitimação de estratégias capazes de construírem estamentos hegemônicos que legitimem o Estado em direcionar a mecânica do controle social ou para operar por meios de atuações por meio de uma instrumentalização indireta gerenciando assim um controle social informal que é desenvolvido pela influência da família, escola, dogmas, das mídias (TV, rádio e mídias sociais), do trabalho e de toda a ciranda social que envolve cada indivíduo, na busca pelo consenso a submissão de cada um desses agentes a instrumentalização real, da regulação social, controlada pelo aparelho ideológico do Estado, isto é, da submissão à ideologia dominante, no qual se cria um condicionamento por onde cada indivíduo deva se basear para gerir suas vidas sociais e particulares, por meio de preceitos e regras estatuídas pelo Estado.

Nesse campo, é sabido que à afronta a certas ordens estão presentes desde o desabrochar civilizatório, desta forma apresenta-se quase como uma metáfora de existência porque ao parar para analisar friamente o comportamento humano, as formas sociais, independente do momento histórico chegarão à conclusão de que por mais que seja desagradável, antiético e/ou imoral, ver-se que, transgredir algumas coisas ou alguém em detrimento de benefícios próprios ou para outrem é um aspecto indissociável das relações humanas. Veja, por exemplo, – na Literatura Cristã – que muito antes do homicídio de Abel (Gênesis 4:8), houve a violação de um Bem Maior porque estando um dos habitantes do Paraíso de frente a uma árvore, violara-a ao comer o fruto proibido (Gênesis 3:6), de forma a não respeitar uma regra imposta de não violar ela, e ao infligir essa condição quebrou-se assim a harmonia universal, para que um ser galgasse benefícios para si.

Nesse passo, inicialmente ante de falar especificamente sobre o Direito Penal no Brasil se faz necessário, preliminarmente, realizar o exame sobre o significado da palavra Direito – desta forma, verifica-se que embora seja coeso entre os estudiosos do tema vê-lo como sendo algo universal -, é muito complicado trazer uma definição fechada do seu significado tendo em vista as múltiplas variáveis de sua polissêmica léxica ou pela sua variedade simbólica que de uma forma ou de outra acaba variando de cultura a cultura o que por sinal dificulta ainda mais lhe dar um significado preciso, uma vez que não só é necessário analisá-lo do ponto de vista da “ciência do direito”, mas também pela zetéticas jurídica[1], como exemplo disso podemos examiná-la partindo do estudo de como se dá o relacionamento de certas comunidades, por meio de sua linguagem. O ilustre, doutrinador Júnior (2018, p. 47), leciona neste caminho que:

(…) é muito difícil, senão impossível, no plano da prática doutrinária jurídica, uma definição neutra, em que a carga emotiva tivesse sido totalmente eliminada. Como a língua é um fenômeno comunicativo, mesmo que tentássemos uma tal definição (como a procurou Kelsen, em sua Teoria Pura do Direito), a discussão teórica acabaria por restabelecer aquela carga em que pese a intenção de seu proponente. (…).

Porquanto, para Gusmão (2018, p.64-66), afirma que o direito poder ser visto a partir de 3 perspectivas que são:

(…) 1°, regra de conduta obrigatória (direito objetivo); 2°, sistema de conhecimentos jurídicos (ciência do direito); 3°, faculdade ou poderes que tem ou pode ter uma pessoa, ou seja, o que pode uma pessoa exigir de outra (direito subjetivo). Examinaremos (…) somente o primeiro sentido da palavra direito (…) o direito, assim pode ser visto como a norma que, se inobservada, poderá ser aplicada coercitivamente pelo poder competente, estatal ou internacional. Por ser norma coercitivamente aplicada quando inobservada, o direito ordena de modo eficaz a sociedade nacional e a internacional. Neste sentido, ele é ordenamento jurídico do Estado e da comunidade internacional. (…)

O estudioso Mascaro (2014, p. 2), relata sobre o tema em destaque ao concluir que “para se entender o fenômeno jurídico (ou seja, a definição da palavra Direito), é preciso, acima de tudo, utilizar-se da ferramenta da história” porque sem esse exame ele afirma que as definições sobre o significado do direito “serão vagas e sem lastros concretos”, uma vez que só depois que se utilizaram essas ferramentas foi possível distinguir aquilo “que por muito tempo chamou-se ser direito, mas hoje entendemos como religião ou até mesmo por política”.

Neste sentido, embora se reconheça que o estudo da definição que abarca o significado da expressão direito seja complexo, ora por suas contradições ora pela dissonância lexical, é importante frisar que dá para prescrever uma aproximação do que esse fenômeno jurídico pode ser transmitido como ciência, entretanto não se pode dizer ainda que seja um conceito cem por cento fechado.

Partindo ainda por essa premissa, afirma ele que a dificuldade, de se ter uma definição precisa do significado do que é Direito reside porque:

A primeira dificuldade para delimitar o conceito de direito reside no fato de que, em geral, o jurista quer partir de suas próprias definições e de ideias abstratas e vagas para, apenas depois, encontrar uma realidade que se adapte às suas teorias. Mas o procedimento deve ser justamente o contrário. É preciso investigar fenômenos concretos e, a partir deles, alcançar uma concepção teórica posterior.

Neste mesmo caminho, o escritor Junior (Ob. cit.), descreve que em geral as grandes conceituações sobre a definição do que é o Direito, isto é, do fenômeno jurídico em sua “essência”:

(…) ou são demasiado genéricas e abstratas e, embora aparentemente universais, imprestáveis para traçar-lhe os limites, ou são muito circunstanciadas, o que faz que percam sua pretendida universalidade. Exemplo do primeiro caso é a afirmação de que o direito é a intenção firme e constante de dar a cada um o que é seu, não lesar os outros, realizar a justiça. No segundo, temos afirmações do tipo: direito é o conjunto das regras dotadas de coatividade e emanadas do poder constituído (…).

Entretanto, embora se saiba que o Direito seja algo muito contraditório, pois no mesmo momento que liberta põe-se a punir, como afirma Mascaro (2014), bem como por possuir uma grande dissonância lexical o que acaba reforçando este e, por sua vez, tudo isso se agrava já que ele não é algo que segue de modo linear, o que acaba corroborando com a fixação de um cenário que se afirmar cada vez mais, principalmente quando se estuda diversos fatores culturais porque a partir desse exame é possível verificar que no desenvolvimento do Direito se verifica além da externalização de suas contradições que sofre existe a incidência de progressos como de retrocessos, afirma Junior (2018).

É importante frisar ainda que há pelo transparecer doutrinários diversos autores que investem na tendência de reduzir o Direito a apenas como um fenômeno da vida social da sociedade (MASCARO, 2014).

Entretanto, pelos escritos de Mascaro (idem), trata-se de uma “tacanha, limitadora e simplória ideia”, tendo em vista que ao pregar que o direito é apenas uma consequência conjectural dos conjuntos normativos instalados na estrutura social é nas palavras dele “empobrecer o conhecimento jurídico” limitando assim ele pela impossibilidade de se construir transformações.

Por isso, para extrair o sulco purificado da essência do direito, deve-se “romper com o reducionismo, de modo a escapar do pequeno mundo das leis para se chegar a um momento de condensação das relações sociais a partir das próprias formas de sociabilidade” e assim poder proceder à qualificação, na sua plenitude do direito a partir da totalidade dos elementos constitutivos dentro das relações sociais estabelecidas em determinada comunidade.

Assim, o jurista não apenas enxergará o direito em virtude das propriedades da norma jurídica o que por si só jamais será alcançado, uma vez que o fenômeno jurídico no seu âmago é quimérico ser entendido somente em suas vias legislativas, jurídicas, legais e normativas, uma vez que para extrair a alma conceitual do direito o fenômeno jurídico necessita ser examinado junto a outros instrumentos que delimitam um conjunto de conhecimento político-econômico-social e cultural.

Desta maneira, esse estudo necessita de uma reflexão sobre os caracteres da antropologia, sociologia, filosofia, história, da política, da religião, da psicologia etc., por exemplo, e isso, nesse comando, se dar em virtude do princípio da totalidade – isto é, um panorama da sociedade estruturada como um organismo social que é analisado num todo social e não por segmentações – que se converge em sentido oposto ao do reducionismo, ao qual se restringe em analisar o fenômeno jurídico por certos pontos, como sendo apenas uma consequência normativa ou como uma questão meramente costumeira, nesse campo, o professor Mascaro (2014. p. 13), promulga que “um juiz racista condena um réu negro por causas culturais, e não só por causas legais”.

Contudo, em linhas gerais, pode-se chegar a uma aproximação sobre a definição da expressão “Direito”, pelos muitos estudos já realizados em busca de sua raiz, nesse caminho, Gusmão (2018, p. 64), leciona que:

A palavra “direito” vem do latim directum, que corresponde à ideia de regra, direção, sem desvio. No Ocidente, em alemão recht, em italiano diritto, em francês droit, em espanhol derecho, tem o mesmo sentido. Os romanos denominavam-no de jus, diverso de justitia, que corresponde ao nosso sentido de justiça, ou seja, qualidade do direito.

Nessa mesma linha de pensamento escreve o doutrinador Jesus (2011, p. 45), afirma que o ponto de partida que cria e conceitua a significação daquilo que compreendemos como Direito é sempre o fator social[2] e nesse sentido descreve em seu livro o seguinte:

(…) O Direito surge das necessidades fundamentais das sociedades humanas, que são reguladas por ele como condição essencial à sua própria sobrevivência. É no Direito que encontramos a segurança das condições inerentes à vida humana, determinada pelas normas que formam a ordem jurídica.

Por esse raciocínio, o autor Maluf (2018, p. 16 – 19) sustenta que o “direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado cumpre assegurar (…), ele nesse caminhar é uma síntese, ou integração do ‘ser’ e do ‘dever ser’; é fato e é norma, pois é o Fato integrado na Norma exigida pelo Valor a realizar”.

A palavra Direito, neste compasso, pode denominar como a representatividade de uma cultura, a forma pela qual uma sociedade conjectura e moldura seus valores individuais ou coletivos (JUNIOR, 2018), contudo, neste momento essa definição não nos importa muito, por isso lançaremos mão de fazer uma análise detalha sobre sua origem para realizar apenas um exame funcional a partir do campo em que entrelaça a palavra direito ao jogo jurídico do positivismo brasileiro, sendo assim, entre as demasiadas acepções e formas que o direito representa nos preocuparemos em debatermos aquela que é moldada perante as estruturas do arcabouço normativo do Brasil que é dar vida ao chamado Direito Penal. Desta forma, anota Junior (2018, p.46) que:

(…) Quando definimos o conceito de direito é, pois, importante saber se estamos preocupados em saber se se trata de um substantivo ou de um adjetivo, ou de um advérbio, tendo em vista seu relacionamento formal (gramatical) numa proposição. Ou se estamos preocupados em saber aquilo que queremos comunicar com seu uso, ou seja, se queremos saber se direito se refere a um conjunto de normas ou a uma faculdade ou a uma forma de controle social (…).

E continua o autor, (Ob.cit.), ao escrever que:

(…) Em parte, o que chamamos vulgarmente de direito atua, pois, como um reconhecimento de ideais que muitas vezes representam o oposto da conduta social real. O direito aparece, porém, para o vulgo, como um complicado mundo de contradições e coerências, pois, em seu nome tanto se veem respaldadas as crenças em uma sociedade ordenada, quanto se agitam a revolução e a desordem. O direito contém, ao mesmo tempo, as filosofias da obediência e da revolta, servindo para expressar e produzir a aceitação do status quo, da situação existente, mas aparecendo também como sustentação moral da indignação e da rebelião. (…) e também um instrumento manipulável que frustra as aspirações dos menos privilegiados e permite o uso de técnicas de controle e dominação que, por sua complexidade, é acessível apenas a uns poucos especialistas (…). (Grifos nossos).

Neste prisma, Junior (2018), descreve que exemplo disso são as afirmações de que o direito são ações firmes e constantes de dar a cada um o que é seu, não lesar os outros, realizar a justiça ou que ele é o conjunto de regras dotadas de coatividade e que são emanadas do poder constituinte, sendo assim o que traremos aqui não será uma definição exata daquilo que o homem comum chama de direito mais fazer uma aproximação sua ao cinturão jurídico.

Desse modo, quando se examina o Direito moderno[3] em perspectiva com o passado, só ganhará especificidade perante a Revolução Industrial no século XVIII, na Idade Moderna, já que antes disso o Direito era inespecífico, misturava-se à moral, com a religião, agora já no pretérito, pode se olhar ele como algo bem mais definido, se tornou um fenômeno mais singularizado, especifico e profundo, (MASCARO, 2012).

A esse respeito, percebe-se que ao se fazer uma arqueologia para entender como o Direito Penal se entrelaça com o desenvolvimento genérico do Direito, acaba notando que de uma forma ou de outra estaremos nos reportando a alguma forma de violência e proteção à propriedade de certo indivíduo, assim examinando-o junto ao desenvolvimento do homem desde seu primórdio, fica nítido que com o passo que crescia a necessidade de o ser humano se agrupar, viu-se necessário também engendrar regras para que a convivência entre os pares se desse de forma harmoniosa e tranquila (BITENCOURT, 2012).

Dentro desse campo, logo então se percebe que conquanto a violência esteja ligada as estruturas genéricas do Direito foi necessário delimitá-lo em áreas especificas para que fosse possível cobrir uma maior área protetiva relacionadas aos bens jurídicos tutelados por este, assim surge o Direito Penal, ele é posto – na sociedade – como um fenômeno social normal, nesse sentido, Bitencourt (2012, p. 55) relembrando as lições de Durkheim, descreve que:

(…) o delito (em referência ao Direito penal) não ocorre somente na maioria das sociedades de uma ou outra espécie, mas sim em todas as sociedades constituídas pelo ser humano. Assim, (…) o delito não só é um fenômeno social normal, como também cumpre outra função importante, qual seja, a de manter aberto o canal de transformações de que a sociedade precisa (…).

A esse respeito o doutrinador, Cunha (2016A, p.33), prega:

Embora o Direito Penal tenha sua origem vinculada à própria organização do homem e a sociedade, não se pode considerar a existência de normas penais sistematizadas em tempos primitivos. Nesse período, o castigo não estava relacionado à promoção de justiça, mas vingança, revide contra comportamento de alguém, abundando penas cruéis e desumanas. Era a fase da Vingança Penal, dividida em: vingança divina, vingança privada e vingança pública. (Grifos nossos).

E prossegue ao prescrever (idem) que:

(…) Ao lado do Direito Penal e da Ciência do Direito Penal, encontra-se o gênero “ciências penais”, preocupando-se “com a delinquência como fato natural, procurando apontar-lhe as causas, com o emprego do método positivo, de observação e experimentação”. Integram esse grupo a Criminologia e a Política Criminal[4].

Já na leitura de Gueiros e Japiasso (2018), relembrando a lição de Heleno Cláudio Fragoso, leciona que o Direito Penal é o conjunto de normas jurídicas mediante as quais o Estado proíbe determinadas ações ou omissões, sob ameaça da pena. Neste prisma, afirmam que ele acaba por:

(…) vincula-se ao longo processo de secularização da disciplina e, em razão disso, foi ganhando, paulatinamente, a preferência lexicológica dos estudiosos e do público em geral, deslocando para um plano secundário a anterior denominação. Contribuiu para a sua prevalência o fato de que Direito Penal representa, imediatamente, a característica principal desse ramo do Direito (a pena)[5].

Neste compasso, ao passar do tempo e com o aperfeiçoamento civilizatório nota-se que o Direito – esse fenômeno jurídico – acaba se desenhando como o paradigma que orientou a própria organização civilizadora, tal orientação vai de encontro aquilo que Montesquieu (1996) orquestrou ao promulgar que o Direito garante não somente o desenvolvimento humano mais à liberdade[6], sendo assim, fixa que o Direito desenvolve-se como sendo algo necessário ao processo de formação civilizatório e não como uma coisa arbitraria.

Partindo dessa finalidade os autores Gueiros e Japiassó, (2018, p. 83) escrevem que:

A vida em sociedade pressupõe o estabelecimento de normas que permitam ou proíbam a realização de determinadas condutas. O conjunto dessas normas ou regras de convivência denomina-se ordem social. A ordem social é assimilada pelos seres humanos por meio do longo processo de educação, sem a necessidade de uma força externa que a imponha. É por meio da família, da escola, da religião, das agremiações esportivas, dentre outras instâncias informais de controle, que se aprende o que se pode ou não fazer. A transgressão de tais regras acarreta sanções, tais como o castigo familiar, a reprovação escolar, a proibição de frequentar uma missa ou de praticar um esporte coletivo.

Essas sociedades jurídicas, por sua vez, eram rodeadas por uma forma econômica de produção, que tem como norte balizador a normatização das condutas humanas através do Estado, no intuito de que tal prática possa levar mais justiça e adequação na composição dos conflitos apresentados por ela, bem como elevar o poder do Estado, isto é, de um organismo social necessário em que se observa o exercício de um governo no anseio que este possa provocar a manutenção da ordem social e controlar os impulsos do desejo humanos. Por esse ângulo evocativo os autores (ob. cit. p. 83-84), lecionam que:

O direito se caracteriza pela previsão de comportamento e de sanção. Ou seja, o Direito pretende regular a vida em sociedade. Para tanto, estabelece comportamentos permitidos e proibidos. Ao proibir uma conduta, o Estado o faz pela ameaça de uma sanção, o que ocorre em todos os ramos do direito.  (…) a ordem social não pode por si só assegurar a convivência das pessoas em comunidade. Ela necessita ser complementada e reforçada pelas instâncias formais de controle, isto é, pelas normas emanadas de um centro de poder, capaz de impor consequências mais intensas àqueles que as transgredir. Surge, assim, o ordenamento jurídico, ou seja, o conjunto de normas ordenadas pelo Estado, detentor do monopólio da força, de caráter geral e cogente. As normas que compõem o ordenamento jurídico podem ter natureza civil, administrativa, econômica, além de tantos outros ramos do Direito, todas vocacionadas para possibilitar a harmônica convivência social (…). (Grifos nossos).

Nesse compasso, o Direito Penal além de ser em qualquer doutrina um apanhado de discusões sobre: seus diversificados ramos, aplicabilidade de pena, classificação do que deve ser ou não tipificado como crime, da teoria do crime  etc., deve ser visto antes de tudo como uma realidade institucional, ou seja, depende de um comportamento consensual para que ele seja capaz de ganhar corpo e forma além de que o nosso Direito Penal sem dúvida sofreu grande influência do Sistema Penal oriundo do Direito Português, assim, nosso país já em 1830 instrumentalizou os grandes aparatos normativos punitivos reduzindo-os a um código e ele por sua vez tinha grande semelhança às leis aplicadas em Portugal, a exemplo disso, é a secularização da norma através dos preceitos primários que diziam respeito ao elemento específico do crime junto ao elemento secundário que descrevia relações com a aplicabilidade da pena, como ela deveria se aplicada, cumprida  etc., a divisão do código em parte geral e especial, assegurado do preceito da reserva legal (CUNHA, 2016A).

Diante disso, logo pode-se perceber que todas as formas como hoje se veem o Direito Penal no Brasil, acaba de uma forma ou de outa estando ligada aos laços referenciais que estruturou a sociedade brasileira, ou seja, atrela-se através do legado cultural e político-institucional ao tempo colonial português. Por conta disso, a história jurídica brasileira segue o tradicionalismo da politicagem brasileira, porque sua formação deriva diretamente da fundação ibérica da sociedade, isto é, de suas raízes.

Posto isso, pode-se dizer que a história do direito penal brasileiro conseguiu construir um caminho, que criou embora lento, uma rota evolutiva que possibilitou que a legislação penal pudesse se modernizar – mesmo com seus traços conservadores – por meio, do crepúsculo civilizatório que busca, embora com baixa velocidade, deixar de mão as questões quantitativas para aprimorar sua aplicabilidade à esfera qualitativa.

Assim, pode claramente ver a lapidação que o Direito Penal brasileiro sofreu nos últimos séculos até chegar à resolução do que hoje se conhece, nesse compasso, pode em outro ângulo, prescrever ele como sendo a evolução cultural de uma civilização arraigada pela condição histórico temporal que a sociedade passou, desta maneira a evolução do direito penal é carregada pelo acúmulo das experiências e das memórias de uma história social que segue no intuito de prevenir e preservar o direito de cada agente social que compõe a sociedade, derrubando assim toda e qualquer forma de arbitrariedade de experiências passadas para se debruçarem as questões humanitárias do Estado brasileiro seja no pretérito ou no futuro.

Nesse passo, é até possível voltar-se a ideia marxista, na parte onde há a remissão de que a infraestrutura[7] tem grande influência, isto é, acaba condicionando a superestrutura[8], neste caso, o entendimento aplicado a legislatura penal é que ele tem que ser condizente à realidade social de uma determinada época, de modo que suas atribuições escritas consigam se mostrar úteis, de forma que seja socialmente próspero, economicamente sustentável e ambientalmente equilibrado por meio das ideias que o momento desperta a fim de regular as regras da atividade humana para que esta possa evoluir social, econômica e politicamente saudável.

Entretanto, “essas concepções jurídicas enfocam a norma ou a lei como eixo de explicação do fenômeno jurídico, como se o direito, como elemento social e histórico, se esgotasse nos Códigos ou em si mesmo”, Pereira (2015, p. 26).

Nesse caso, Pereira (2015, p. 71), enxerga o Direito como sendo “um campo social específico, com autonomia relativa frente aos demais elementos da vida social” e que não se “expressa apenas como um fenômeno objetivo, concreto e histórico, como uma relação social que pode ser estudada de forma científica, de modo a desvelar suas determinações sociais”, uma vez que ao examiná-lo profundamente consegue concluir que ele possui a capacidade de exercer um “papel ideológico, (…) influenciando os atos dos indivíduos em suas escolhas e posições através de um conjunto de análises e conceitos, que, em sua totalidade, constituem uma determinada visão social. Comparece, neste caso, como uma ideologia[9]

Por conta disso as relações jurídicas desenhadas e redesenhas pelos humanos estão sempre pautadas pela sociabilidade humana e dentro do positivismo para se manter a coesão social (mesmo que temporariamente) essas formas se expressam formalmente em normas com as Constituições, Leis, Decretos, resoluções, sentenças  etc., nesse entender verifica-se que o Direito não vem sendo encarado pela ideologia jurídica como sendo um fenômeno eminentemente social, mas sim por uma realidade compostas e determinada pela história  (PEREIRA, 2015).

Atualmente há ainda um longo caminho para que o Direito Penal represente de fato a cultura social do tempo em que ele vigora, mas já tivemos avanços significativos, porém ainda é necessário trazer a democratização a legislação penal no tocante a sua timidez em fazer a discriminação de muitos crimes que hoje à sociedade não os enxergam como um ato criminoso, por outro lado há também a necessidade de aplicar novas consequências penais a determinadas condutas para que se consiga alcançar o satisfatório bem coletivo.

Há ainda uma forte necessidade de rever nossa forma de aplicar as penas, principalmente quanto ao encarceramento em massa que promovemos desenfreadamente, uma vez que tais medidas tem se tornado muito drástica e que não traz resultados significativos ao desenvolvimento social, talvez o que falta na seara penal é o estudo conjunto com a criminologia, a vitimologia, a política criminal, a antropologia, a sociologia, a psicologia, a Penalogia e outras ciências para poder melhor compreender qual objetivo a Justiça Penal deve cumprir (VIANA, 2018).

 

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[1] O autor Júnior (2018, p. 52), prescreve que é o campo das investigações zetéticas do fenômeno jurídico é bastante amplo. Zetéticas são, por exemplo, as investigações que têm como objeto o direito no âmbito da Sociologia, da Antropologia, da Psicologia, da História, da Filosofia, da Ciência Política etc. Nenhuma dessas disciplinas é especificamente jurídica. Todas elas são disciplinas gerais, que admitem, no âmbito de suas preocupações, um espaço para o fenômeno jurídico. À medida, porém, que esse espaço é aberto, elas incorporam-se ao campo das investigações jurídicas, sob o nome de Sociologia do Direito, Filosofia do Direito, Psicologia Forense, História do Direito etc. Existem, ademais, investigações que se valem de métodos, técnicas e resultados daquelas disciplinas gerais, compondo, com investigações dogmáticas, outros âmbitos, como é o caso da Criminologia, da Penalogia, da Teoria da Legislação etc.

[2] Nesse seara, Bitencourt (2012, p. 55-56) prescreve que as relações humanas são contaminadas pela violência, necessitando de normas que as regulem. E o fato social que contrariar o ordenamento jurídico constitui ilícito jurídico, cuja modalidade mais grave é o ilícito penal, que lesa os bens mais importantes dos membros da sociedade.

[3] (…) o direito é para os homens uma experiência psicológica vivida, particularmente sob a forma de regras, de princípios ou de normas gerais (…), leciona Pachukanis (1988, p. 37).

[4] Também fazem parte das ciências penais a antropologia criminal, a psicologia e a psiquiatria criminais, a sociologia criminal, estatística criminal e da Penalogia.

[5] Gueiros e Japiasso (2018, p. 82).

[6] Angularmente, prescreve, Rusche e Kirchheimer (2004, p. 23) que os diferentes sistemas penais e suas variações estão intimamente relacionadas às fases do desenvolvimento econômico.

[7] Trata-se das relações sociais que concretizam a relação entre patrões-empregados empregados-empregados, ou seja, nada mais é que a base econômica da sociedade capitalista, onde, segundo Marx, as relações de troca se exteriorizam e são marcadas por mecanismos que exploram a força de produção em detrimento do acumulo do excedente, isto é, lucro (MARX, 1993).

[8] Pode ser entendido, de maneira simples, como sendo a ação dominante de certos grupos no intuito de petrificar seu domínio, ou seja, é uma estrutura de poder jurídico-política e ideológica (Estado, Religião, Artes, meios de comunicação etc.) (MARX, 1993).

[9] A ideologia se apresentaria, nesse contexto, como um conhecimento invertido, equivocado, que teria como objetivo (…) elaborar uma concepção falsa da história ou abstraindo-se dela, obstaculizando a compreensão e superação dessas relações sociais (…). desta forma, a (…) ideologia tem o sentido de falsa consciência, diz respeito ao conhecimento, à elaboração ideal, que desconhece sua base material, suas determinações sociais, seus condicionamentos históricos (PEREIRA, 2015, p. 72).

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